Herói da pandemia: 'Preso a uma cama, praticamente como um vegetal'

 

Gustavo Carona: A Luta de Um Herói da Pandemia Contra a Sua Própria Dor


Gustavo Carona será sempre lembrado como um dos "anjos da pandemia". Médico intensivista, dedicou a sua vida a salvar outras, estando na linha da frente durante os dias mais sombrios da Covid-19. Contudo, hoje, enfrenta uma batalha muito diferente: a sua própria doença. Gustavo vive com dor crónica, uma condição que o acompanha 24 horas por dia e que transformou a sua vida num verdadeiro calvário. Como ele próprio admite, a força para continuar vem sobretudo da vontade de poupar sofrimento à mãe e à irmã.

Durante os dias de confinamento, quando o medo era uma constante e as notícias sobre a pandemia dominavam o nosso dia-a-dia, o nome de Gustavo Carona tornou-se conhecido em Portugal. Era o rosto da coragem e do altruísmo. Médico na linha da frente, foi fundamental para salvar vidas e ajudar a compreender melhor a doença que assolava o mundo. Mas, quando a pandemia começou a abrandar, foi o corpo de Gustavo que cedeu.

Tudo começou com dores ciáticas e uma tristeza inexplicável. Inicialmente diagnosticado com burnout, depressa ficou claro que havia algo mais. A dor tornou-se permanente, levando ao diagnóstico de uma doença grave, crónica e incurável. Hoje, Gustavo vive grande parte do tempo confinado ao quarto e à cama, numa batalha diária contra uma dor neuropática constante.

Foi nesse contexto que recebeu Júlia Pinheiro em sua casa, para uma conversa íntima e comovente. Habituado a cenários de catástrofe nas suas missões humanitárias, Gustavo nunca imaginou enfrentar uma batalha tão pessoal, que o afastaria da medicina e das pessoas que sempre ajudou. “São diferentes camadas de luto”, confessou. Desde abandonar a prática clínica até perder a capacidade de socializar e, por vezes, a vontade de viver, cada etapa tem sido um desafio imensurável.

Gustavo revelou ainda que chegou a enfrentar pensamentos suicidas, especialmente durante crises de dor intensas no final de 2023. Foi o amor pela mãe e pela irmã que o impediu de tomar uma decisão mais drástica. “Sentia que, se o fizesse, estaria a matá-las também. Só por isso consegui segurar-me”, explicou emocionado.

Apesar de ter passado por uma cirurgia recente que lhe trouxe algum alívio, Gustavo descreve a sua condição de forma honesta e crua: “Passei do estado desesperado para péssimo. E quando estamos péssimos, o péssimo até parece bom, mas continua a ser péssimo”. Esta nova realidade, marcada por dor constante, desafia a sua capacidade de encontrar momentos de felicidade.

Como médico, o conhecimento que possui sobre a gravidade da sua condição torna tudo ainda mais difícil. “Saber exatamente o que a doença me reserva é desesperante”, admitiu. Mesmo assim, Gustavo não deixa de se dedicar a causas humanitárias, agora através das redes sociais, onde procura sensibilizar e ajudar outras pessoas. Contudo, este trabalho é agridoce: “Abro todos os dias uma ferida, lembrando-me do que queria ser e já não sou: médico no sentido clínico”.

A história de Gustavo Carona é uma lição de resiliência e amor. É um testemunho do quanto a força humana pode ser alimentada pelo amor à família e pela vontade de fazer a diferença, mesmo quando tudo parece perdido. A luta de Gustavo continua, inspirando-nos a valorizar a vida, mesmo nos momentos mais difíceis.

Comentários